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Ácido Lático- Qual a sua Influencia no Exercício

Certamente já ouviu falar deste termo já que está intimamente relacionado com exercício físico, mas será que sabemos o que é, como se acumula e onde, o que poderemos fazer para o evitar e remover? Estas e outras questões serão brevemente respondidas e o deixarão mais elucidado sobre esta temática. Terão que ser abordados alguns temas de biologia e termos específicos para entender o processo mas tentarei ser o mais específica para que numa linguagem acessível possamos perceber.acido latico

ÁCIDO LÁTICO- O que é o ácido lático?

O ácido lático é um ácido monocarboxílico que, no organismo humano, resulta da metabolização celular da glicose com fins energéticos. Falamos habitualmente do ácido láctico quando falamos da prática de exercício físico. À semelhança dos restantes cetoácidos do metabolismo energético, também o ácido láctico tende, no ambiente celular, a perder um ião hidrogénio e a transformar-se em lactato. Por essa razão, do ponto de vista fisiológico, faz mais sentido falar-se em lactato do que em ácido láctico.

Em termos mais simples e para perceber melhor este lactato resulta da utilização da energia na célula para ser utilizada no exercício.

 Como age e qual a sua importância?

 acido latico Para realizarmos quase todas as tarefas que nosso corpo necessita para a nossa sobrevivência (funções biológicas), ou para que possa realizar uma ação do nosso comando (movimentos e exercícios), é necessário um gasto de energia para que isto aconteça.  Esta energia é proveniente de uma molécula chamada ATP (adenosina trifosfato – uma molécula universal condutora de alta energia, fabricada em todas as células vivas como um modo de capturar e armazenar energia. Consiste de base púrica adenina e do açúcar de cinco carbonos ribose, aos quais são adicionados, em arranje linear, três moléculas de fosfato). 

À medida que o corpo vai realizando as suas funções, o ATP é degradado e, consequentemente, posteriormente é restaurado por outra fonte energética que pode ser proveniente da fosfocreatina (uma outra molécula geradora de energia), das gorduras, dos hidratos de carbono ou das proteínas.  Conforme as necessidades energéticas vão avançando, o corpo utiliza o pouco ATP que ele tem disponível para realizar suas funções, a medida que o ATP acaba, é solicitado o uso da fosfocreatina para ressintetizar o ATP, porém a fosfocreatina também é pouca no nosso organismo.  Então as necessidades energéticas continuam e o nosso organismo solicita outro macronutriente para realizar a ressintese do ATP. Entretanto, neste momento o nosso corpo precisa fazer uma escolha, ele precisa determinar qual substrato energético utilizar: gordura, na forma de triglicerídeos, ou hidratos de carbono, na forma de glicose ou glicogénio muscular. Essa escolha irá depender de dois fatores: (1) a velocidade de ressintese do ATP; e (2) se há ou não a presença de oxigénio durante o processo de transformação.

Na presença de oxigénio e na pouca necessidade de solicitação deste macronutriente, o organismo utilizaria a gordura para ressintetizar ATP, uma vez que a gordura gera mais ATP que a glicose, e a sua fonte é praticamente ilimitada no nosso corpo, não levando-o ao risco de sofrer pela má utilização deste substrato. Por outro lado, na necessidade de alta velocidade de ressintese do ATP o organismo irá optar pela glicose ou glicogénio hepático e muscular; como em exercícios extenuantes e muito intensos. Isso também ocorreria na ausência de oxigênio durante o processo de transformação para gerar energia, chamado de ciclo da glicólise.

Esse ciclo seria capaz de gerar energia suficiente para ressintese do ATP, mas teria um efeito indesejável, a produção de ácido láctico (um subproduto “tóxico” gerado no decorrer do ciclo de ressintese do ATP), que faria com que o exercício fosse interrompido minutos depois pela instalação da fadiga muscular dos músculos ativos (músculos exercitados).

O lactato não deve ser encarado como um produto de desgaste metabólico. Pelo contrário, proporciona uma fonte valiosa de energia química que se acumula como resultado do exercício intenso. Quando se torna novamente disponível uma quantidade suficiente de oxigénio durante a recuperação, ou quando o ritmo do exercício diminui, NAD+ (coenzima NADH em sua forma oxidada) varre os hidrogénios ligados ao lactato para subsequente oxidação a fim de formar ATP.

Os esqueletos de carbono das moléculas de piruvato formados novamente a partir do lactato durante o exercício serão oxidados para a obtenção de energia ou serão sintetizados  (transformados)  para glicose (gliconeogénese)  no ciclo de Cori. O ciclo de Cori não serve apenas para remover o lactato, mas o utiliza também para reabastecer as reservas de glicogênio depletadas no exercício árduo.

Como ocorre a produção de Ácido Láctico 

Quando a oxidação do lactato iguala a sua produção, o nível sanguíneo de lactato  mantém-se estável, apesar de um aumento na intensidade do exercício e no consumo de oxigénio. Para as pessoas sádias, porém destreinadas, o lactato sanguíneo começa a acumular-se e sobe de maneira exponencial para aproximadamente 55% de sua capacidade máxima para o metabolismo aeróbico. A explicação habitual para uma aumulação de lactato sanguíneo durante o exercício pressupõe uma hipóxia (falta de oxigenação da musculatura) tecidual relativo.

Quando o metabolismo glicolítico predomina, a produção de nicotinamida adenina dinucleotídio  (NADH – coenzima envolvida na transferência de energia)  ultrapassa a capacidade da célula de arremessar seus hidrogênios  (elétrons)  através da cadeia respiratória, pois existe uma quantidade insuficiente de oxigénio ao nível tecidual. O desequilíbrio na liberação de oxigênio e a subseqüente oxidação fazem com que o piruvato (substrato final da degradação da glicose; muito importante para a formação do lactato)  possa aceitar o excesso de hidrogênios, o que resulta em acúmulo de lactato.

O lactato é formado continuamente durante o repouso e o exercício moderado. As adaptações dentro dos músculos induzidas pelo treinamento aeróbico permitem os altos ritmos de renovação do lactato; assim sendo, o lactato acumula-se para os níveis mais altos de exercício que no estado destreinado.

Outra explicação para a acumulação de lactato durante o exercício poderia incluir a tendência para a enzima desidrogenase lática  (LDH)  nas fibras musculares de contração lenta favorecer a conversão de lactato para piruvato. Portanto, o recrutamento das fibras de contração rápida com o aumento da intensidade do exercício favorece a formação de lactato, independentemente da oxigenação tecidual.

A produção e acumulação de lactato são acelerados quando o exercício se torna mais intenso e as células musculares não conseguem atender às demandas energéticas adicionais aerobicamente nem oxidar o lactato com o mesmo ritmo da sua produção.

Como responde o organismo na presença do Ácido Láctico 

Depois do lactato ser formado no músculo,  difunde-se rapidamente para o espaço intersticial e para o sangue, para ser tamponado e removido do local do metabolismo energético. Dessa forma, a glicólise continua fornecendo energia anaeróbica para a ressíntese do ATP. Essa via para a energia extra continua sendo temporária, pois os níveis sanguíneos e musculares de lactato aumentam e a regeneração do ATP não consegue acompanhar o seu ritmo de utilização. A fadiga instala-se de imediato e diminui o desempenho nos exercícios.

acido-lactico

A maior acidez intracelular e outras alterações medeiam a fadiga, pela inativação de várias enzimas na transferência de energia e pela deterioração das propriedades contráteis do músculo. Entretanto, a maior acidez (pH mais baixo) por si só não explica a redução na capacidade de realizar exercícios durante um esforço físico intenso.

No exercício extenuante, quando as demandas energéticas ultrapassam tanto o suprimento de oxigénio quanto seu ritmo de utilização, a cadeia respiratória não consegue processar todo o hidrogênio ligado ao NADH. A liberação contínua de energia anaeróbica na glicólise depende da disponibilidade de NAD+ para oxidar 3-fosfogliceraldeído  (subproduto da degradação da glicose); caso contrário, o ritmo rápido da glicólise “se esgota”. Durante a glicólise anaeróbia, NAD+ “é liberado” à medida que pares de hidrogênios não-oxidatos “em excesso” se combinam temporariamente com o piruvato para formar lactato. O acúmulo de lactato, e não apenas sua produção, anuncia o início do metabolismo energético anaeróbio.

A ressíntese dos fosfatos de alta energia (ATP) terá que prosseguir com um ritmo rápido para que o exercício extenuante possa continuar. A energia para fosforilar o ADP  (resultado final do ATP depois de liberar energia), durante o exercício intenso deriva principalmente do glicogênio muscular armazenado através da glicólise anaeróbica  (ritmo máximo de transferência de energia igual a 45% daquele dos fosfatos de alta energia), com a subseqüente formação de lactato. De certa forma, a glicólise anaeróbica com formação de lactato poupa tempo. Torna possível a formação rápida de ATP pela fosforilação ao nível do substrato, mesmo quando o fornecimento de oxigênio continua sendo insuficiente e/ou quando as demandas energéticas ultrapassam a capacidade do músculo para a ressíntese aeróbica do ATP.

Os acúmulos rápidos e significativos de lactato sangüíneo ocorrem durante o exercício máximos  (extenuante) que dura entre 60 a 180 segundos. Uma redução na intensidade desse exercício árduo para prolongar o período do exercício acarreta uma redução correspondente tanto no ritmo de acúmulo quanto no nível final de lactato sangüíneo.

No exercício extenuante com um catabolismo elevado dos carboidratos, o glicogênio dentro dos tecidos inativos podeacido-latico2tornar-se disponível para atender às necessidades do músculo ativo. Essa renovação  (turnover)  ativa do glicogênio, através do reservatório permutável de lactato muscular, progride à medida que os tecidos inativos lançam lactato na circulação. O lactato proporciona um precursor gliconeogênico capaz de sintetizar os carboidratos  (através do ciclo de Cori no fígado e nos rins)  que irão permitir a homeostasia  (tendência do organismo em manter constantes as condições fisiológicas)  da glicose sangüínea e atender às demandas energéticas do exercício.

O lactato produzido nas fibras musculares de contração rápida pode circular para outras fibras de contração rápida ou de contração lenta para ser transformado em piruvato. Por sua vez, o piruvato é transformado em acetil-CoA para penetrar no ciclo do ácido cítrico para o metabolismo energético aeróbico. Esse lançamento do lactato entre diferentes células faz com que a glicogenólise  (conversão de glicogênio em glicose)  que ocorre em uma célula possa suprir outras células com combustível para a oxidação. Isso torna o músculo não apenas o principal local de produção do lactato, mas também um tecido primário para a remoção do lactato através da oxidação. Qualquer lactato formado em uma parte de um músculo ativo acaba sendo oxidado rapidamente pelas fibras musculares com uma alta capacidade oxidativa (coração e outras fibras do mesmo músculo, ou dos músculos vizinhos menos ativos). 

O que acontece com o ácido lático e como é o processo de sua remoção

O ácido lático é removido do sangue e dos músculos durante a recuperação após um exercício exaustivo. Em geral, são necessários 25 minutos de repouso-recuperação para remover a metade do ácido lático acumulado.

A fadiga surge após os exercícios nos quais se acumularam quantidades máximas de ácido láctico, a recuperação plena implica remoção desse ácido tanto do sangue quanto dos músculos esqueléticos que estiveram ativos durante o período precedente de exercícios.

Em geral, pode dizer-se que são necessários 25 minutos de repouso-recuperação após um exercício máximo para se processar a remoção de metade do ácido lático acumulado. Isso significa que cerca de 95% do ácido lático serão removidos em 1 hora e 15 minutos de repouso-recuperação, após um exercício máximo.

O termo repouso-recuperação dá-se pelo facto que o ácido lático é mais velozmente removido se a recuperação ativa em baixa intensidade for empregada após o exercício, do que se o indivíduo permanecer em repouso (inativo)  logo após o exercício.

Durante um exercício submáximo, porém árduo, no qual o acúmulo de ácido lático não é tão grande, será necessário menos tempo para sua remoção durante a recuperação.

Em condições aeróbicas, o ritmo de remoção do lactato por outros tecidos corresponde a seu ritmo de formação, resultando na ausência de qualquer acúmulo efetivo de lactato, isto é, a concentração sangüínea de lactato se mantém estável. Somente quando a remoção não mantém paralelismo com a produção, o lactato acumula-se no sangue.

Existem quatro destinos possíveis para o ácido lático 

– Excreção na Urina e no Suor – Sabe-se que o ácido lático é excretado na urina e no suor. Entretanto, a quantidade de acido lático assim removida durante a recuperação após um exercício é negligenciável.

– Conversão em Proteína – Os carboidratos, incluindo o ácido lático, podem ser convertidos quimicamente em proteína dentro do corpo. Entretanto, também foi demonstrado nos estudos que apenas uma quantidade relativamente pequena de ácido lático é transformada em proteína durante o período imediato de recuperaçã após um exercício.

– Oxidação/Conversão em CO2 e H2O – O ácido lático pode ser usado como combustível metabólico para o sistema do oxigênio, predominantemente pelo músculo esquelético, porém o músculo cardíaco, o cérebro, o fígado e o rim também são capazes dessa função. Na presença de oxigênio, o ácido lático é transformado, primeiro, em ácido pirúvico e, a seguir, em CO2 e H2O no ciclo de Krebs e no sistema de transporte de elétrons, respectivamente. É evidente que o ATP é ressintetizado em reações acopladas no sistema de transporte de elétrons.

O uso de ácido lático como combustível metabólico para o sistema aeróbico é responsável pela maior parte do ácido lático removido durante a recuperação após um exercício intenso.

É razoável suspeitar de que pelo menos parte da demanda de oxigénio e da energia ATP associada com a remoção do ácido lático é fornecida pelo oxigénio consumido durante a fase de recuperação lenta (intensidade de trabalho abaixo de 60% do VO2máx.).

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Como podemos lidar com o ácido lático e o que fazer para sustentar a intensidade do exercício na presença dele.

A capacidade de gerar altos níveis sanguíneos de lactato durante o exercício máximo aumenta com o treino anaeróbio específico de velocidade-potência e, subsequentemente, diminui com o destreinamento.

A manutenção de um baixo nível de lactato conserva também as reservas de glicogénio, o que permite prolongar a duração de um esforço aeróbico de alta intensidade.

Foi observado em pesquisas que, a elevação dos níveis de lactato observada nos indivíduos treinados quando exercitados agudamente foi significativamente menor que a observada nos sedentários. Tais resultados reproduzem os achados clássicos descritos na literatura, o que nos permite avaliar como eficazes, tanto na intensidade do exercício agudo na determinação de modificações no metabolismo energético, quanto o protocolo de treinamento físico na produção de adaptações orgânicas. Em outras palavras, treinar para aumentar o limiar anaeróbico.

Referências Bibliográficas
  • FOSS, M.L.; KETEYIAN, S.J. Bases Fisiológicas do Exercício e do Esporte. 6ª ed. Rio de Janeiro. Guanabara Koogan, 2000.
  • MCARDLE, William D. et al. Fisiologia do Exercício – Energia, Nutrição e Desempenho Humano. 5.ed. Rio de Janeiro. Guanabara Koogan, 2001.

Raquel Madeira Personal Trainer

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raquelpersonaltrainer.com

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3 Responses

  1. Lauro diz:

    Excelente artigo!

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